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Paulo de Oxalá

Os idiomas africanos e as gírias brasileiras


Uma conhecida minha viajava de metrô e escutou: “Ah, desacuenda! A mona vai sair do caminho do ọkọ”. Ela, curiosa e intrigada com aquelas palavras, pesquisou na internet, mas não ficou satisfeita com as explicações que encontrou e resolveu me perguntar o que aquelas palavras tinham a ver com o Candomblé.


Foi quando expliquei que as palavras yorubás, kimbundo ambundo e ewe-fon são empregadas em nossos Terreiros como forma de preservar a origem das línguas africanas no Candomblé.


Na época da colonização eram trazidos escravos de várias etnias. As primeiras etnias que vieram para o Brasil foram de Angola e Congo, chamados de bantus e falavam o kimbundu, ambundo, kikongo e outros idiomas. Depois, vieram os nagôs também chamados de yorubás por causa de sua língua nativa. Eles habitavam a Nigéria e parte do antigo Dahomé (atual Benin). E por último, o povo jeje que também habitava o Dahomé e falava a língua ewe-fon. Jeje vem da expressão yorùbá Àjèjì que significa: estrangeiros, forasteiros, e era assim que os yorubás chamavam os escravos de origem ewe-fon.


Quando o Candomblé foi organizado na Bahia definiram-se as três principais etnias chamadas pelos mais velhos de “Nações”. Com esta definição ficou estabelecido que a língua usada em cada “Nação” seria a língua da etnia africana correspondente, conforme relaciono a seguir.


Nação Ketu - língua: yorùbá.

Nação Angola - língua: kimbundo, ambundo, kikongo.

Nação Jeje - língua: ewe-fon.


Tal qual o latim e as línguas indígenas, muitas palavras de origem africana foram transformadas e incorporadas ao nosso vocabulário.


Mas, qual a relação disso tudo com as gírias atuais e com um número enorme de palavras de origem africana usadas no nosso dia-dia?


A palavra “samba”, por exemplo, é corruptela do ambundo semba que significa umbigada, pois era assim que o povo angolano dançava: dando umbigadas uns nos outros.


Da cultura Jeje, incorporamos ao nosso idioma: “faca” (do ewe faka) e “tijolo” (do ewe tijiló).

Dos bantus temos uma infinidade de palavras, tais como: angu, bandalafumangá, batuque, muamba, mandinga, mona, muqueca, fubá, cuenda e urucubaca.


Os Yorubás também deram sua contribuição na forma do nosso vocabulário, como por exemplo, “acarajé” que vem de àkàrà que significa: bolo ou pão; agogô do yorùbá: agogo, que significa sino, que aqui no Brasil virou instrumento de percussão, e o próprio nome dos Orixás, em yorùbá: Òrìṣà. Os nomes dos Orixás se tornaram populares como, por exemplo: Iemanjá, que no original é Yemọjá, e significa “Mãe dos peixes”.


Em relação à dúvida da minha conhecida, esclareço que graças aos diversificados profissionais iniciados no Candomblé, que levaram para ruas e repartições suas linguagens ritualísticas é que estas expressões se popularizaram. É comum ouvir tais palavras e expressões em novelas de televisão, sem causar maiores surpresas.


Analisando a frase dita por aquela pessoa no metrô, ela misturou palavras do kimbundo, português e yorùbá.

“Ah, desacuenda! A mona vai sair do caminho do ọkọ”:

Des: de despreocupar-se.

Cuenda: do kimbundo, cuende (andar).

Mona: do kimbundo mona – criança, que é usada nos Terreiros de Angola para designar meninas e mulheres.

Ọkọ: em yorubá é marido. Oko Òrìṣà da agricultura e ọ̀kọ̀ é lança. Mas aqui neste caso, ela estava referindo-se ao marido da mulher que ela estava conversando e quis dizer: “Não se preocupe, a mulher vai sair do caminho do seu marido”.


Tal confusão no nosso entendimento foi gerada porque cada Terreiro usa a língua que a identifica como “Nação”; e por isso, não se deve misturar numa mesma expressão palavras yorùbá e kimbundo porque são línguas de etnias totalmente distintas, apesar de conseguirmos compreender o contexto, yé, mò (entendeu?)


“Èyí tí Olórun bùkún gbogbo”

Que Deus abençoe a todos!


Para criança falar mais rápido:

Torre uma pena de galo e coloque num saquinho de pano na cor azul e esconda nas coisas da criança. Quando ela estiver falando, despache este saquinho num mato.


Para você que trabalha com a voz (atores, locutores, cantores, dubladores, jornalistas, professores, palestrantes e outros):

Cozinhe um inhame kará, deixe esfriar, parta-o ao meio, passe na sua garganta e despache-o numa encruzilhada aberta fazendo seus pedidos com fé a Soróke (Xorokê).


Axé!





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