Wander Pires, um James Brown com Axé

Foto: Wander Pires e James Brown / Wander - Douglas Lied / Brown – divulgação
Intérprete sofreu preconceito religioso por cantar pontos de Malunguinho
Wander Pires é uma grande referência do carnaval, um intérprete que carrega em sua voz a força de um trovão e a emoção de um griô. Dono de uma potência vocal impressionante, ele faz tremer as arquibancadas do Sambódromo e leva o público a um estado de êxtase semelhante ao que James Brown proporcionava nos palcos do funk e do soul.
Assim como o “Padrinho do Soul”, Wander Pires tem uma presença cênica arrebatadora e uma entrega visceral. James Brown transformava qualquer apresentação em um espetáculo de pura energia e conexão com o público, e Wander Pires faz o mesmo na Avenida. Ele não apenas canta o samba-enredo, mas o encarna, trazendo a ginga, o improviso e a intensidade que fazem dele um dos maiores intérpretes da história do Carnaval.
Com sua voz encorpada e sua interpretação vibrante, Wander Pires faz lembrar o jeito único de James Brown de se comunicar com o público, levando-o do choro ao delírio em poucos segundos. Mas enquanto Brown tinha o “soul power”, Wander tem o axé – essa energia mística que atravessa os tambores do samba e faz do Carnaval um espetáculo que vai além do entretenimento, tornando-se uma experiência espiritual e ancestral.
E essa conexão com a ancestralidade também se reflete no respeito que Wander Pires tem pela fé. Recentemente, ele sofreu preconceito religioso por cantar pontos de Malunguinho, entidade que está sendo homenageada pela Viradouro neste ano 2025. Mas nada disso tirou-lhe o foco de cantar e louvar as entidades e Orixás através do samba. Em 2024, Wander abrilhantou e arrepiou a avenida ao entoar o enredo ‘Arroboboi, Dangbé’, exaltando a cultura afro-brasileira com sua potência vocal inigualável.
O preconceito contra o Candomblé e a Umbanda ainda se manifesta em diversas formas, atingindo artistas, sacerdotes e praticantes que apenas desejam exercer sua fé em paz. Um cantor com a força de Wander Pires, que canta a beleza dos Orixás, fortalece a luta contra o preconceito, o racismo e a intolerância religiosa.
Mas a potente voz de Wander, assim como a de James Brown, que desafiou as barreiras impostas à cultura negra nos Estados Unidos, é um grito contra a discriminação. No Carnaval, onde os atabaques encontram os tamborins, Wander exalta a fé sem medo, provando que o samba e o Candomblé são inseparáveis, pois ambos são expressões da resistência e da identidade do povo negro.
Por todas as Escolas em que passou, Wander deixou seu legado artístico, que se mantém vivo na memória dos desfiles e na emoção de cada componente que já teve a honra de cantar sob sua condução. Sua voz potente e marcante não apenas embala os sambas, mas os eleva a um patamar de grandiosidade, tornando-se a identidade sonora de carnavais históricos.
Na Viradouro, escola campeã de 2024, o grito de guerra de Wander Pires na Marquês de Sapucaí ecoou no desfile, assim como a voz de James Brown revolucionou a música negra nos Estados Unidos. Ambos são ícones que transcendem suas respectivas artes, transformando suas performances em algo inesquecível. Wander Pires, com seu axé, é o James Brown do samba-enredo: um intérprete que não canta apenas com a voz, mas com a alma e a força dos Orixás. Seu canto não é apenas melodia, mas um chamado, uma evocação que desperta sentimentos profundos, conduzindo a avenida como um maestro conduz uma orquestra.
Alô povão! Alô Wander Pires! A hora é essa!
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