Fé, resistência e denúncia: o 23 de abril entre a devoção e o racismo religioso
- Paulo de Oxalá
- 23 de abr.
- 2 min de leitura

Foto: Tainá Louriçal e Ogum e São Jorge – redes sociais e Pai Paulo de Oxalá
São Clemente celebra São Jorge
O dia 23 de abril é marcado pela força, pelo axé e pela fé de milhares de devotos que celebram, juntos, São Jorge e Ògún — santo e Orixá que, na tradição religiosa afro-brasileira, representam coragem, luta e proteção. Mas, neste ano, em meio à alegria das homenagens, a fé também foi atravessada pela dor, pelo racismo e pela intolerância.
A paciente Tainá Louriçal, internada no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, na Tijuca, Zona Norte do Rio, denunciou ter sido vítima de racismo religioso durante o tratamento contra um câncer de mama. Segundo relato, Tainá deixou seus fios de contas no quarto ao ir tomar banho. Os fios de contas — colares sagrados que representam proteção espiritual — desapareceram após a troca de roupa de cama e teriam sido descartados por funcionárias da unidade.
“Fui tomar banho, deixei meus fios aqui. Quando voltei, tinham jogado fora. Estou muito triste, isso não se faz”, desabafou a paciente nas redes sociais.
Em nota, o hospital afirmou que está apurando o caso com rigor e que repudia qualquer forma de intolerância.
Só a força da fé em Ogum e São Jorge para resistir
Mas, para amenizar essa dor que não passa assim, do outro lado da cidade, nas quadras das escolas de samba e nos terreiros de fé, São Jorge é reverenciado com samba, feijoada e oferendas. Na São Clemente, a imagem do santo guerreiro será recebida hoje com festa e devoção. A rainha de bateria Raphaela Gomes, que escolheu pessoalmente a imagem a ser homenageada, destacou:
“São Jorge é devoção e proteção para o meu pai. Por ser associado a Ogum, essa conexão me toca profundamente. A religiosidade afro-brasileira está nas raízes do samba.”
A história do samba e das escolas de samba se entrelaça com a espiritualidade afro-brasileira desde suas origens. Na Praça Onze, berço da cultura negra no Rio, mulheres como a Yalorixá Ciata de Oxum, conhecida como Tia Ciata, mesclavam ritmos ancestrais, reza e comida. Hoje, escolas como Portela, Salgueiro, Viradouro e Beija-Flor mantêm vivos os símbolos dos Orixás em seus barracões e desfiles, reafirmando a identidade do povo negro e de sua fé.
Reflexão:
O episódio vivido por Tainá mostra que precisamos avançar muito no respeito à liberdade e à diversidade religiosa — especialmente às tradições de matriz africana, que continuam sendo alvo de discriminação, preconceito, racismo e intolerância.
Neste 23 de abril, entre a fé celebrada e a dor exposta, a força de Ogum e São Jorge nos lembra que resistir também é um ato de fé. Que suas espadas abram caminhos para mais respeito, mais justiça e mais amor.
Porque onde há axé, há vida.
E onde há fé, há esperança.
Axé para todos!
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